Opinião: Em Defesa de IAs Generativas Open Source – Questão de Soberania Digital para o Brasil

Opinião: Em Defesa de IAs Generativas Open Source – Questão de Soberania Digital para o Brasil

Parte desse texto foi escrito com base na experiência da 4Linux e também do debate em Davos – “Open Source AI Infrastructure Ecosystem | AI House Davos 2025” com a participação de Bill Jia (VP Engineering, Google), Yann LeCun (VP & Chief AI Scientist, Meta FAIR) e Neil Lawrence (DeepMind Professor of Machine Learning, University of Cambridge).

A empresa DeepSeek mostrou que o código aberto e livre é o caminho que mais rapidamente permite o desenvolvimento de um ecossistema nacional de IA robusto.

O Brasil já teve um papel de liderança no uso e promoção do Software Livre. Na década de 2000, algumas poucas iniciativas governamentais de líderes corajosos no enfrentamento de empresas estrangeiras apontavam para um caminho independente, reduzindo a dependência de gigantes americanas como Oracle, Microsoft e IBM. No entanto, essa estratégia foi gradativamente desmontada, à medida que a indústria de software proprietária conseguiu impor seu domínio econômico e político, convencendo (seria convencimento?) diversos setores do governo a investir em licenças milionárias de sistemas fechados. O resultado foi a estagnação da indústria nacional de tecnologia e a criação de uma dependência crônica de plataformas estrangeiras.

Nos últimos anos, a inteligência artificial (IA) tornou-se um dos pilares mais estratégicos da economia global, impulsionando desde a automação industrial até a tomada de decisões no setor público. No entanto, o Brasil enfrenta um dilema crucial: seguir dependente de soluções proprietárias, pagando cifras astronômicas para empresas estrangeiras, ou retomar o protagonismo na adoção do Open Source, garantindo soberania digital e fomentando de verdade uma indústria nacional de IA. O modelo de código aberto representa não apenas uma oportunidade tecnológica, mas uma necessidade estratégica para o país recuperar sua autonomia na era da inteligência artificial.

O que aconteceu com o Software Livre no Brasil pode se repetir com a IA Generativa. Atualmente, o desenvolvimento da IA é amplamente controlado por empresas como Google, Meta, OpenAI, etc, que estabelecem as regras de uso e acesso a seus modelos. Essas empresas não apenas cobram caro por suas APIs e infraestrutura, mas também restringem a transparência sobre como esses modelos operam, seus vieses e suas limitações. No debate realizado em Davos, os especialistas reforçaram que o controle dessas tecnologias por poucas corporações gera um cenário de monopólio e reduz a capacidade de inovação aberta. Assim como no passado, ignorar o Open Source pode significar a exclusão do Brasil da próxima grande revolução tecnológica.

Exemplos concretos mostram como o Open Source é um motor para inovação e criação de novas empresas. A Red Hat, por exemplo, construiu um império bilionário oferecendo suporte e customização para distribuições Linux. Se não fosse pelo modelo de código aberto, ela sequer existiria, já que sua base tecnológica sempre esteve fundamentada em software livre. O mesmo ocorre com empresas que dependem de frameworks Open Source como PyTorch e TensorFlow para desenvolver soluções de IA. No setor de inteligência artificial, as plataformas abertas são o único caminho para democratizar o acesso à tecnologia e permitir que empresas brasileiras desenvolvam modelos próprios sem precisar pagar royalties a big techs.

Não faltam outros exemplos de empresas internacionais que beberam (e bebem) da fonte do Open Source e vendem licenças proprietárias hoje para o Brasil: Microsoft, SUSE, SAP, Huawei, Amazon, Apple, Google, Infosys; Samsung, etc… Nada contra estas empresas  mas o Brasil tem potencial para desenvolver suas tecnologias para vendermos para fora e não sermos apenas consumidores passivos nesse mercado.

Além da questão econômica, há um fator estratégico inegável: a segurança e a governança dos dados. Modelos de IA proprietários, hospedados em servidores estrangeiros, podem representar um risco à privacidade e ao controle das informações sensíveis do país. Como mencionado no debate, a IA está se tornando o “repositório de todo o conhecimento humano”, e confiar esse poder a empresas estrangeiras significa abrir mão da soberania digital. Com o Open Source, o Brasil poderia hospedar, treinar e aprimorar seus próprios modelos, garantindo que suas bases de dados e algoritmos estejam sob seu total controle.

Outro fator crítico é a escalabilidade e o custo. A IA Generativa proprietária é extremamente cara, tanto em termos de uso de APIs quanto na infraestrutura necessária para rodá-la. Como apontado no debate, o custo de inferência de modelos fechados é um dos principais obstáculos para sua adoção massiva. Modelos Open Source, por outro lado, permitem que governos e empresas ajustem e otimizem sua infraestrutura, reduzindo significativamente os custos operacionais e permitindo o desenvolvimento de soluções personalizadas para cada necessidade.

O Brasil precisa olhar para a IA Generativa Open Source não apenas como uma opção, mas como um imperativo estratégico. Assim como países europeus já começam a discutir a regulamentação do uso de IA proprietária e o incentivo ao desenvolvimento de soluções abertas, o Brasil deve estruturar uma política nacional para fomentar o desenvolvimento de modelos de código aberto. Isso inclui investimentos em pesquisa, parcerias com universidades e startups, além da criação de uma infraestrutura robusta para treinar e manter esses modelos dentro do país.

A história já mostrou que a dependência de tecnologia estrangeira custa caro e limita o crescimento do setor nacional. O Brasil perdeu a oportunidade de se consolidar como uma potência em Software Livre, mas ainda há tempo para corrigir essa rota na inteligência artificial. Adotar IAs Generativas Open Source significa garantir a soberania digital, reduzir custos e fomentar um ecossistema de inovação verdadeiramente brasileiro. Não se trata apenas de tecnologia, mas de estratégia, independência e um futuro onde o Brasil não seja apenas consumidor, mas protagonista da revolução da inteligência artificial.

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Marcelo Marques
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Marcelo Marques é cofundador da Rankdone, Jedai e 4Linux, e atualmente atua como CEO da Rankdone. Concluiu o curso "Artificial Intelligence: Implications for Business Strategy" pela MIT Sloan School of Management, consolidando sua expertise em estratégias empresariais aplicadas à inteligência artificial. Empreendedor com experiência em tecnologia e inovação, atuou na criação da Startup Jedai, voltada para soluções avançadas de IA e educação. Atua também como AI Strategic Business Advisor na Intellinode.ai, em Delaware, EUA. Administrador pela FASP, especializado em Marketing pela Trevisan Escola de Negócios e pós-graduado em Gestão Empresarial pela FGV.

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